Quem acompanha nosso site, já deve ter lido nosso texto sobre o “pai” de Resident Evil, Sweet Home, jogo de terror lançado há trinta anos que foi parte da base da franquia Resident Evil. Nesse sentido, a “mãe” de Resident Evil seria então Alone in the Dark, clássico lançado para computadores há 27 anos, em 1992.
Por que Alone in the Dark foi tão essencial para que Resident Evil pudesse ter sido lançado quatro anos depois? É o que você vai descobrir neste texto! Vamos lá!
Em 1992, Capcom e Midway reinavam no mercado de arcades com os clássicos Street Fighter 2 e Mortal Kombat, dois devoradores de fichas que se tornaram fenômenos da cultura popular nos anos seguintes. No mercado de consoles, por sua vez, Sonic 2 e Super Mario lutavam pelo título de mascote mais cool dos video games. Por outro lado, no universo dos computadores, uma produtora francesa começaria a escrever um novo capítulo na história dos jogos.
Lançado em 1992, inicialmente para PCs compatíveis com MS-DOS, Alone in the Dark foi um jogo sui generis. A idéia partiu da cabeça de Frederick Raynal, um programador contratado pela Infogrames em 1990.
Após trabalhar na conversão do jogo de plataforma poligonal Alpha Waves (chamado de Continuun, fora da França), Raynal começou sozinho a adptar o motor gráfico desse jogo para fosse capaz de desenhar personagens articulados. Baseado principalmente nas limitações técnicas, Raynal desenvolveu a ideia de um jogo de aventura, em que o jogador enfrentaria sozinho monstros; com o tempo ele reuniu uma equipe e um protótipo foi desenvolvido e apresentado à Infrogrames. Nascia ali Alone in the Dark.
O início do jogo é praticamente um esboço do que Resident Evil apresentaria quatro anos depois: de cara, o jogador deve escolher entre dois protagonistas, o homem – Edward Carnby, um detetive particular, e Emily Hartwood, cujo tio morreu em circunstâncias misteriosas dentro da sinistra mansão que será palco da aventura – que é rapidamente exibida na abertura.
Quando o jogador assume o controle no sótão, já podemos notar os desafios que Raynal e sua equipe tiveram. Se por um lado, os cenários pré-renderizados foram a solução para a impossibilidade do motor gráfico lidar com cenários tridimensionais, por outro ajudaram a dar o ar de mistério e suspense, solução esta que Resident Evil copiou à risca. Falando nisso, você se lembra da famosa cena dos cachorros pulando pela janela?
Ela veio daqui:
Voltando ao jogo, o sotão funciona como um tutorial, criando situações para o jogador aprender a movimentar o personagem, pegar os primeiros items e principalmente lutar contra os primeiros monstros, que aparecem caso o jogador demore a movimentar o baú no plano frontal e o armário que fica ao fundo.
Outra característica herdada por Resident Evil é a escassez de recursos, pois se você pode encontrar uma espingarda logo na primeira tela, a munição disponível é pouca, assim como os items de cura. Assim, o jogador é incentivado a nem sempre entrar em confronto, e por vezes buscar outras soluções. Um exemplo claro é a sala de jantar, onde o jogador se vê cercado por monstros que despertam de repente. Lutar contra todos é inviável, então a solução é deixar uma panela de sopa sobre a mesa, atraindo assim os monstros e liberando a saída para o cômodo seguinte.
Dessa forma, os quebra-cabeças são a tônica de Alone in the Dark, muito mais que a ação, cabendo ao jogador ficar atento e ler os documentos e cartas espalhados pela mansão. Falando nisso, esses documentos também revelam detalhes escondidos da trama e dos personagens de Alone in the Dark, tal qual os arquivos de Resident Evil fariam posteriormente.
Por outro lado, o desafio é alto e exige bastante do jogador, por bons e maus motivos. A mansão em si é perigosa e cheia de locais que causam morte instantânea, mesmo resultado caso o jogador erre alguns quebra-cabeças. Mas a dificuldade também advém das limitações inerentes do jogo, como a movimentação muito lenta dos personagens, o infame controle “tanque” (por sinal, também herdado por Resident Evil), e o combate injusto, que por vezes faz o jogador ser preso por combos infinitos dos monstros.
Como vocês já notaram, embora Alone in the Dark tenha sido um grande jogo de seu tempo, ele envelheceu muito mal. Tudo é simples e primitivo demais para os padrões atuais, e jogar Alone hoje requer muita paciência e boa vontade para ser aproveitado mais do que uma curiosidade histórica dos video games.
Para terminar, uma última curiosidade. Resident Evil é tão baseado em Alone in the Dark, que mesmo Resident Evil 2 copiou uma porção de Alone in the Dark 2. Sim, se lembram da parte que você joga com a pequena Sherry?
Pois é, em Alone in the Dark 2 você também joga com uma menina, a pequena Grace. Vejam:
Alone in the Dark não foi apenas um grande sucesso quando foi lançado, a ponto de ter iniciado uma franquia que é lembrada até hoje, mas um marco dos video games, pois foi o jogo que deu o ponto de partida para o que hoje conhecemos como survivor horror. Curiosamente, Alone in the Dark foi lançado no Japão ainda em 1992, e sua influência sobre Resident Evil é tal, que vejam vocês, Shinji Mikami, criador da franquia, admitiu em uma entrevista ao jornal Le Monde, em 2014, que adaptou o modelo de Alone após tê-lo jogado, chegando a admitir ao jornal, que se não fosse por Alone in the Dark, Resident Evil poderia ter sido um jogo de tiro em primeira pessoa.
E é isso, amigos. Sem Alone in the Dark, não existiria Resident Evil. Sem Edward Carnby e Emily Hartwood, não teríamos Chris Redfield e Jill Valentine.
Paulista de Taubaté, Designer Gráfico, Designer de Games, quality assurance tester, tradutor de Inglês e Francês e dono do blog e canal Loading Time.