O mundo do terror tem visto uma grande leva de remakes nos últimos anos. Independente de se tratar de filmes ou jogos, a constante produção de remakes segue a todo vapor na cultura pop. Nesse espírito, um dos grandes clássicos do cinema que receberá uma nova entrada nas telonas é o saudoso filme Nosferatu (1922) de F.W. Murnau, sendo este remake dirigido por Robert Eggers, diretor de ”A Bruxa” (2o15) e ”O Farol” (2019) e contando com Bill Skarsgård (It a Coisa) no papel do assustador vampiro Conde Orlok.
Neste artigo, vamos explorar um pouco a história do filme Nosferatu e deixar uma breve avaliação sobre essa importante obra.
Contexto histórico e expressionismo alemão
Nosferatu foi um dos filmes vanguardistas do expressionismo alemão, uma corrente artística que ganhou força dentro do cinema da época que ainda era mudo. O expressionismo alemão surge na década de 1920 em um contexto histórico onde a Alemanha estava completamente devastada econômica e moralmente face a comunidade internacional em decorrência de sua derrota na Primeira Guerra Mundial. Nesse contexto, o país tentava se reestabelecer por meio da república de Weimar (1919-1933), o governo intermediário entre o Império Alemão e o Regime Nazista, entretanto, a tensão política era constante e o governo se encontrava na corda bamba entre o caos econômico e conflitos com movimentos insurgentes ligados ao comunismo e outros ligados ao nazismo.
Nesse contexto de inseguranças constantes da população, a arte voltou-se a temáticas pessimistas, sombrias e contemplativas acerca da negatividade da natureza humana e a insanidade. Além disso, haviam muitos temas góticos e sobrenaturais, como é o caso do filme que abordamos neste artigo.
Um filme que quase foi apagado para sempre
Desde sua concepção, Nosferatu foi pensado para ser uma adaptação do célebre “Drácula” de Bram Stoker, o importantíssimo livro que condensou e preconizou vários temas da mitologia moderna dos vampiros, como comentamos mais profundamente nesse artigo. Entretanto, apesar de hoje em dia os personagens e histórias contidas no livro serem de domínio público, na época em que a Prana-Film estava produzindo Nosferatu, os direitos autorais da Drácula eram de posse da Sra. Florence Stoker, viúva do escritor Bram Stoker, esta que não estava ciente que a obra de seu marido fora usada como base para o filme.
Ao saber que havia um filme alemão sendo vendido como uma adaptação da obra de seu marido, Florence Stoker ficou indignada e entrou com uma ação judicial para exigir uma compensação financeira e a destruição das cópias dessa adaptação não autorizada. Os roteiristas dos filmes haviam tentado mudar os nomes dos personagens e alguns detalhes para disfarçar a adaptação (o que ainda poderias ser entendido como plágio), mas o esqueleto da trama e alguns detalhes essenciais entregavam completamente. Florence Stoker venceu a ação contra os produtores de Nosferatu e conseguiu que várias cópias do filme fossem destruídas e suas exibição fosse interrompida; o fato do filme ainda existir hoje se deve ao fato de que algumas cópias comercializadas para o exterior sobreviveram e o material pôde ser remontado a partir do que restou.
Resenha sobre Nosferatu
Levando em consideração a época e o contexto de seu lançamento, é impossível não classificar Nosferatu como um filme revolucionário e um dos criadores do gênero do terror. O clima terrível é muito bem estabelecido na ansiedade e na expectativa que se cria até o momento de Hutter (Gustav Von Wangenheim) encontrar-se com o vampiro Conde Orlok (Max Schreck) ou Nosferatu.
O filme constrói Nosferatu como uma figura oriunda diretamente de um conto de bruxas e seres sombrios, inclusive, algo que adiciona muito a esse clima é a estilização das cartelas de texto e os próprios escritos que contextualizam o espectador sobre a natureza desse vampiro tão nefasto. Apesar dessa obra ser uma adaptação do romance Drácula de Bram Stoker, ela toma bastante liberdade em diferenciar Conde Orlok de Conde Drácula, por exemplo: substitui-se o charme intelectual e carismático de Drácula por uma criatura com um aspecto muito mais grotesco e comportamento de um animal sorrateiro.
A interpretação de Max Schreck em relação ao comportamento de Nosferatu é muito eficiente em construir essa associação visual do vilão aos ratos, algo que rima perfeitamente com a narrativa do vampiro ser o portador de uma grave e mortífera pestilência. Essa construção de vilania em camadas é muito eficiente em fazer o espectador sentir de forma orgânica na pele o que o filme estabelece acerca do Conde: medo e repulsa. O jogo de sombras muito característico desse filme também é muito eficiente para construir a presença de Nosferatu, sempre enfatizando sua silhueta sorrateira e ameaçadora como uma criatura predatória da noite.
É impossível também não exaltar as atuações de todo o restante do elenco, afinal, esse é um dos filmes vanguardistas do expressionismo alemão no contexto do cinema mudo. Nesse sentido, é possível observar como os atores estão sempre entregando com eficiência a mensagem das cenas por meio de gestos, expressões corporais e faciais com um exagero que não se tornou defasado com o tempo, muito pelo contrário, ele adiciona toda uma camada adicional de charme ao filme.
Nesse ponto, vale completamente exaltar o papel da incrível Greta Schroder, intérprete de Ellen, a esposa de Hutter e principal alvo do cruel Conde Orlok. A atriz é a que mais se destaca com suas expressões e atuação, inclusive, apesar de ser uma clássica personagem do tipo ‘’donzela em perigo’’ ela acaba sendo a grande responsável pela derrota de Nosferatu. Interessante também é o fato de que ela condensa em si duas personagens do livro de Bram Stoker, inicialmente encarnando o que parecia ser uma versão de Mina Murray, porém tendo um drama de controle e influência do vampiro que emula uma parte do arco de Lucy Westenra.
Em termos gerais, esse filme é um grande clássico que merece ser apreciado para sempre na história do cinema, não só por ter resistido a quase ser extinto como também por ter moldado a forma como se constroem bons antagonistas e histórias de terror. Sem dúvida, Robert Eggers terá uma tarefa e tanto em recontar essa história de seu próprio jeito e adicionando todos os elementos característicos de suas produções que combinam muito bem com toda a ideia do filme original e as temáticas pertinentes ao cinema no expressionismo alemão.
O remake de Nosferatu estreará nos cinemas estadunidenses no dia 25 de dezembro de 2024, e ainda não foi revelada a data de estreia no Brasil.
Alagoano, Redator do EvilHazard, fã do universo do Terror e apaixonado por Resident Evil