Quando se fala em Resident Evil, as associações imediatas que são feitas costumam ser a zumbis, mutantes cheios de olhos e tentáculos, mutilações e ambientes com forte potencial claustrofóbico e etc. Entretanto, com a chegada dessa nova era de sucesso para a franquia, observa-se que novos elementos de horror vão sendo adicionados aos jogos, alguns destes, inclusive, sendo readaptados com base em conceitos descartados mais antigos.
Estes novos elementos, por vezes, acabam dividindo a opinião dos fãs por parecerem muito destoantes da proposta geral dos jogos, e é justamente sobre um desses elementos que discutiremos no presente artigo: as alucinações, que tem feito parte destacada nos últimos títulos da franquia, e tudo indica que continuarão fazendo parte também de jogos futuros!
Desde Resident Evil 7, todos os jogos de Resident Evil (com exceção do Remake de RE2) contam com alguma cena ou sequência de gameplay contendo alucinações, e tornou-se impossível não comentar sobre isso, especialmente após a Capcom ter reimaginado completamente o inimigo U-3 para a campanha de Ada em Resident Evil 4 Remake, adicionando sequências inteiras de batalhas com alucinações.
Antes de comentar sobre o uso desse elemento nos jogos mais recentes e na DLC Separate Ways de RE4 Remake, vale fazermos algumas recapitulações sobre a concepção dos elementos de alucinação nos jogos de Resident Evil, reflexão esta que nos levará ao próprio Resident Evil 4.
É de conhecimento dos fãs mais assíduos da franquia que a produção do Resident Evil 4 original foi um show de dificuldades e conceitos descartados. Dentre estes, o jogo chegou a ter diversas versões descartadas que são conhecidas popularmente como ”Resident Evil 3.5”, e entre estas, a que importa para nossa discussão de hoje, pasmem, é a conhecida como ”Alucinação”.
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Não ironicamente, essa é a versão descartada de RE4 que mais mexeu com o imaginário dos fãs desde sua divulgação na E3 de 2003. Os vídeos promocionais de gameplay mostravam Leon andando no que deveria ser o castelo de Spencer até que um filtro azulado tomava conta da tela, indicando que ele estava alucinando devido a uma provável infecção com o vírus Progenitor. A partir disso, o protagonista era confrontado com bonecos que se mexiam, e o principal: aparecia a estranha figura de um homem espectral segurando um gancho, daí o famoso nome do inimigo, ”Hookman”.
Esse conceito foi descartado mesmo após ser exibido ao público por ser algo muito diferente do que se esperava de um jogo de Resident Evil à época; isso forçou Shinji Mikami a seguir com uma abordagem um pouco mais familiar para seu Resident Evil 4, inserindo inimigos físicos reais e não construtos da mente de um Leon infectado.
Após alguns anos, Resident Evil 7 teve sua concepção e lançamento em 2017, e com ele, todo o plot referente aos efeitos neurodegenerativos do Mutamiceto nas mentes da família Baker e também nas mentes de Ethan e Mia Winters. Mais para o final do jogo, existem sequências inteiras mostrando Mia e Ethan confrontando a influência de Eveline, e apesar de não ser um embate no mesmo estilo da luta com Hookman em RE 3.5, é possível notar as mudanças de filtro e a insanidade no gameplay.
Pulando o remake de Resident Evil 2 e indo para RE3 Remake, o início do jogo exibe uma breve cena com alucinações e que, mesmo não sendo um trecho de gameplay, vale a pena a menção por ser a única instância nessa lista em que o delírio não é causado por uma arma biológica, e sim, por puro estresse e paranóia. A cena em que Jill está no espelho e se vê como um zumbi é bem impactante por explorar o estado mental conturbado da personagem, não só pelo fato de que ela está sob vigia constante por parte da Umbrella, como também sofrendo pelo estresse pós traumático após os eventos na mansão Spencer e sob o medo do T-Vírus, acarretando a preocupação de estar infectada ou não. Vale ressaltar também um momento mais perto do ato final, no qual Jill tem um pesadelo com Carlos se transformando em um zumbi.
Em Resident Evil Village, a questão das alucinações retorna trazendo um misto do que foi experimentado em RE7 misturado com a proposta de RE 3.5, e surge daí o segmento da Casa Beneviento. Considerado por muitos como o cenário mais perturbador do jogo, esse segmento de gameplay acompanhando Ethan sofrendo intensas alucinações na Casa de Donna Beneviento acabou sendo muito bem recebido, mesmo sendo bem diferente dos outros cenários de RE Village e das noções gerais sobre a franquia.
A presença do macabro feto que persegue o protagonista, as ilusões de Mia e as bonecas vivas são frutos do controle de Donna Beneviento sobre um químico que, em contato com o pólen de algumas flores cultivadas no jardim da mansão, cria todas as alucinações vividas por Ethan, que são imediatamente desfeitas após a morte de Donna.
Vale lembrar que a DLC de RE Village, Shadows of Rose, é majoritariamente uma grande alucinação a partir do momento em que Rose adentra no dito ‘Reino da Consciência’ que nada mais é do que um estado induzido pelo contato com e a rede de memórias e consciências interligadas de pessoas que morreram e foram assimiladas pela consciência coletiva maior do Megamiceto ou deus negro.
Partindo finalmente para RE4 Remake, apesar desse jogo não explorar muito as alucinações dentro de sua gameplay na campanha principal, a sua DLC Separate Ways mudou completamente esse cenário ao trazer o segundo Verdugo como um chefe recorrente e também a transformá-lo no U-3, agora “Pesanta”.
A reformulação foi muito além de fazer dois personagens em um, pois U-3 ganhou o nome de ‘Pesanta’, que foi uma criada no Castelo Salazar submetida e testes com o Las Plagas, conduzidos pelo Dr. Isidro Uriarte Talavera, mais conhecido como o primeiro Verdugo, o mesmo que Leon derrota.
Pesanta começa a perseguir Ada desde o início, e como a heroína está infectada com a Plaga, o monstro consegue induzir fortes alucinações em Ada, simulando diversas cópias de sua imagem, além de criar ilusões de teletransporte. A mudança de filtro também ocorre e juntamente com a movimentação de Pesanta, ajuda a escancarar a inspiração em Hookman de RE 3.5. Após Ada matar a criatura, ela também causa a morte do pequeno parasita que estava dentro de si, eliminando o último resquício do horror de Pesanta.
Estes foram alguns dos usos de alucinações como elemento de terror nos jogos mais recentes de Resident Evil, nitidamente, a continuidade do uso desse artifício parece certa em próximos lançamentos (especialmente em Resident Evil 9), levando em consideração a frequência com que a Capcom vem se utilizando disso. É interessante e essencial que a franquia continue respeitando os pontos mais centrais que a caracterizam, porém um elemento como esse, se bem utilizado, pode criar ótimos segmentos de terror!
Alagoano, Redator do EvilHazard, fã do universo do Terror e apaixonado por Resident Evil